Pois
é, nos propomos a pensar e externalizar nossos pensamentos neste Blog as reflexões
sobre as "vestimentas" que colocamos durante a vida, e que muitas
vezes esquecemos do porque as usamos e de como elas tornam nossos movimentos
mais lentos e difíceis.
Minha
vida caminha sem grandes novidades neste semestre/ano, a grande diferença para
os outros foi o estágio na educação infantil. Nunca pensei em trabalhar na
educação infantil, mas aqui estou, e posso dizer que estou adorando.
Alguns
momentos causaram-me estranhamentos, como o dia em que no
parque João* beijou Maria*, ambos de 3 anos. Dentro da casinha Maria estava
deitada no colo de João, o menino a beijou na boca, eu observei de longe sem
interferir. Comentei com a professora da turma. Ela comenta: "a Maria tem
um comportamento muito adulto, o João esta fazendo o que ela esta mandando, semana
passada era outro menino."
As crianças estão reproduzindo uma cena
que viram pessoalmente? Ou por uma mídia? Será que a cultura modela, influencia
e constrói a identidade dessas crianças? Somos donos de nossas vontades ou a
cultura nos coloca para interpretar determinadas condutas desde a infância? Se Maria
estava mandando no João, porque ela parecia passiva as ações do menino? Porque a
culpa é da Eva, da mulher, da menina? Machismo? São questões que passam pela
minha cabeça e me tocam, como não se deixar tocar por uma cena de beijo?
Principalmente quando os protagonistas tem apenas 3 anos de idade?
Assim, no outro dia vi uma cena
que mexeu comigo ainda mais – Gabriel* beijou Rafael* - na boca! Dois meninos de
3 anos se beijavam (na boca) na casinha do parque, e dias depois repetiram o
ato no banheiro. A cena me causou as mesmas reflexões que a anterior, mas dessa
vez com a inclusão de ficar pensando horas sobre sexualidades, afetividades,
homossexualidade e homoafetividade.
O que nós educadores podemos falar
sobre sexualidade, nossa formação (no curso superior) não nos prepara para
isto, este aspecto sai ignorado pelas licenciaturas desta universidade, o que
sabemos sobre isto, em geral, aprendemos fora dos espaços instituídos como
educativos.
Sobre este beijo fiquei na minha
inocência pensando sobre se já é possível ser homossexual nesta fase da criança,
e a construção da identidade desses garotos. Minha questão foi alimentada ainda
mais por uma outra criança.
Em outro momento Gabriel beijou Elohin*,
que se afastou e perguntou: "Gabriel, eu não sou sua mãe, porque você esta
me beijando?" Para Elohin, quem os meninos beijam (ou deveriam beijar) é a mãe. Assim, ele
entende que os garotos tem liberdade para a demonstração desse afeto com a mãe.
Elohin vê limites para a expressão de sua afetividade com o amigo, enquanto que
Gabriel parece desconhecer esse limite.
Esta resposta de Elohin ao beijo,
respondeu para mim sobre o que a princípio não parecia óbvio. Que tais
situações são muito mais uma afetividade do que uma sexualidade. E ainda – para
mim um beijo carrega muitos significados, mas para uma criança de 3 anos, o
beijo carrega outros, que dificilmente consigo descobrir, é muito difícil me
por no lugar deles nestas ocasiões. Nas
observações pude ver que a mãe de Gabriel é muito afetuosa com ele, manda beijo
a distância e despede-se com um eu te amo, o menino pode receber a mesma afetividade
e educação do pai.
Gabriel e Rafael não devem ter
reproduzido uma cena que viram pessoalmente ou por outros meios, esta cena
ainda é muito censurada no Brasil, e tanto amigos quanto pais e filhos não se
beijam na boca na nossa cultura; e neste caso os amigos demonstram uma
afetividade independente do gênero que nossa cultura machista e homofóbica lida
como natural.
A resposta de Elohin sem
homofobia, violência, ou constrangimento diante da situação, seria outra se ele
já tivesse entendido que nossa cultura coloca a homoafetividade como algo a ser
repelido e eliminado? A resposta de Elohin traduziu meu estranhamento diante
destas situações, e esclareceu a pergunta a ser feita diante dessas duas cenas – o que
significou aquele beijo?
Nossa eu gostei muito desta postagem!
ResponderExcluirEu trabalho com educação infantil faz mais de 3 anos e tenho as mesmas duvidas que você!!!!
Me sinto muito perdida/pressionada para tratar/não tratar destes assuntos com as crianças!
=(
Fantástica postagem! Não sei se é porque este foi um ano atípico nas disciplinas de Educação Infantil, mas posso dizer que este assunto, TÃO IMPORTANTE, passou em branco. No meu trabalho, o questionamento de pais, professores sobre sexualidade fizeram com que a psicologa da escola passasse alguns meses estudando o assunto para nos dar uma palestra. E mesmo sendo em apenas 2 horas foi SENSACIONAL! Fiquei feliz por essa oportunidade pois ela tratou exatamente assim: sexualidade está muito para além do "sexo". Desde bebês experimentamos diferentes formas de nos relacionar sexualmente, seja no banho que a nossa mãe nos dava, no toque do corpo nas trocas de fraldas e que desta forma, neste momento sexualidade está relacionada à afetividade. E enfim, assim as coisas vão caminhando até nos tornarmos adultos e vivenciarmos, propriamente, o sexo. É uma pena que nossa formação foi tão carente!
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